Eu sou o vidro

Hoje vou mostrar, com transparência, minha longa vida de transformação ao lado do Homem.

De lendas criadas sobre minha descoberta à datação de peças achadas em escavações arqueológicas e, principalmente, todas as mudanças que minha existência proporcionou ao dia a dia do ser humano.

Conta a lenda que nasci de uma alquimia acidental, quando numa fogueira feita por fenícios, sobre a areia, foram depositadas pedras de sílica que junto com o fogo fez na manhã seguinte um líquido viscoso escorrer desta fogueira. Esse, ao esfriar, cristalizou-se como uma pedra preciosa encantando os mercadores. Minha existência é milenar. Achados arqueológicos indicam o meu uso em peças pequenas de bijuteria e decoração.

Adornei faraós, enfeitei suas tumbas e guardei produtos de beleza de reis e rainhas em formas ainda rudimentares. Fui desejado por impérios e comercializado como jóia. Em terras egípcias, os fornos foram aquecidos por foles que aumentaram minha temperatura, facilitando o meu manuseio. Fui soprado como um balão e deram formas novas a meu existir. Levado ao ocidente, por romanos conquistadores que, com técnicas mais apuradas, moldaram a arte de me criar.

Na Idade Média, narrei histórias religiosas para seus fiéis em mosaicos coloridos que adornavam as catedrais. Com o meu amadurecimento, fui misturado e modificado. Adicionando chumbo, virei cristal e, pintado com prata, refleti a imagem deste criador. Ao lado do ouro, decorei os mais lindos castelos e me tornei um precioso artigo de ostentação para nobres.

Com a areia escorrendo dentro de mim, marquei o tempo e vi a popularização do meu uso chegar às mãos dos meros mortais, ajudando a focar suas visões e a matar suas sedes. Temperaram minha alma, e deixei o mau tempo do lado de fora. Da chuva e do vento, protegi os seus passeios sobre rodas. Um brinde à vida no tilintar dos meus encontros.

O tempo todo estou ao lado de vocês, será que não percebem isso?
Minha natureza inusitada faz com que eu assuma várias formas e tenha muitas utilidades. Eu queria ter visto Thomas Edson acender sua lâmpada sem minha transparência.

A ciência e a tecnologia me impulsionam sempre à frente. A comunicação via rádio e televisão não existiriam sem que meu corpo protegesse as antigas válvulas incandescentes.

O homem enxergou o espaço e olhou para dentro de seu corpo ajustando o foco em minhas lentes, observou o microcosmo que o cerca, misturou fórmulas em meus recipientes. Dados percorrem o meu ser levando informações de alta qualidade pelo mundo, e, assim, eu sei que ainda tenho um longo caminho a percorrer com o meu inventor.

Texto: Luiz Carlos Bruno

Participação: João Victor

Revisão: Hermínio Mattos Russo e Maria Gabriela Matos de Oliveira.