Vidro metálico supera ligas tradicionais do metal

Os novos vidros metálicos à base de titânio são os compósitos mais resistentes construídos até hoje

13/09/2010




O vidro metálico é uma nova classe de compósito estrutural baseado no titânio

Cientistas do Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos Estados Unidos, criaram uma nova classe de compósitos estruturais baseados no titânio. Os novos materiais, classificados como vidros metálicos, são mais leves e mais baratos, além de manterem a tenacidade e a ductilidade – a capacidade para ser deformado sem quebrar – do caro metal original.

Ligas de zircônio

No início deste ano, o mesmo grupo descobriu uma nova forma para criar compósitos dos chamados metais líquidos, um novo tipo de material metálico estrutural com características similares às dos plásticos. Então, eles estavam trabalhando principalmente com o zircônio. “São ligas com tenacidade e resistência sem comparações. Elas estão entre os materiais sintéticos mais resistentes que existem atualmente,” conta Douglas Hofmann, que coordena o grupo de pesquisadores.

Mas havia algumas limitações para essas super ligas. Como elas foram criadas para uso na indústria aeroespacial – entre outras aplicações estruturais – elas precisavam ter densidades muito baixas. Idealmente, as ligas deveriam ter densidades semelhantes à das ligas de titânio cristalino, que se situam entre 4,5 e 5 gramas por centímetro cúbico (g/cc). As ligas originais, feitas predominantemente de zircônio, ficaram entre 5,6 e 6,4 g/cc, o que as colocava em uma espécie de “terra-de-ninguém das densidades de estruturas aeroespaciais,” diz Hofmann.

Ligas de titânio

Para levar as promissoras ligas para áreas mais habitáveis, Hofmann e seus colegas começaram a ajustar os componentes usados na fabricação dos compósitos. O resultado foi um grupo de ligas metálicas com um elevado percentual de titânio, mas que mantém as propriedades das ligas de zircônio criadas anteriormente, muito mais parecidas com uma cerâmica do que com uma liga de titânio tradicional.

“Apesar de serem baseadas no titânio”, observa Hofmann, “essas ligas apresentam as mesmas propriedades impressionantes das ligas de zircônio. Elas ainda são resistentes a trincas e rachaduras – e continuam sendo dúcteis. Na verdade, eles são ainda mais dúcteis do que as ligas que criamos inicialmente.” Os vidros metálicos têm merecido grande atenção da NASA, devido às suas propriedades de leveza e resistência. Eles também já foram usados para resfriar células solares, na fabricação de antenas dobráveis e até para a fabricação de ímãs para motores de veículos elétricos.


Entendendo os vidros metálicos

Quando um metal líquido é resfriado abaixo da sua temperatura de fusão, inicia-se um processo de nucleação dos átomos, que se posicionam de modo a formar uma estrutura ordenada que se repete por todo o volume do material; o sólido assim formado é chamado de cristal. Esse processo é o que geralmente ocorre em metais (ou ligas metálicas) que são resfriados desde o estado líquido. Entretanto, descobriu-se recentemente que, sob certas condições, é possível a obtenção de ligas metálicas, a partir do estado líquido, cujos átomos, ao invés de se agruparem ordenadamente, o fazem de modo aleatório. Esses sólidos assim formados recebem a denominação geral de vidros. Diferentemente dos sólidos cristalinos, os vidros não apresentam ordenamento espacial periódico de seus átomos; eles são estruturas amorfas.

Na natureza, esses vidros são encontráveis em forma de silicatos ou em compostos de silício e oxigênio, mas não são vistos na forma de metais. Pesquisas realizadas indicaram ser a velocidade de resfriamento um fator importante na obtenção de ligas metálicas na estrutura amorfa – a partir disso, técnicas de resfriamento rápido foram desenvolvidas, o que possibilitou a fabricação de um grande número de ligas metálicas e metais na forma amorfa.

Esses vidros metálicos apresentam características bastante diferentes dos metais cristalinos: suas propriedades elétricas e magnéticas são bastante interessantes e vantajosas para certas aplicações, em relação aos metais cristalinos. Apresentam também uma maior resistência à oxidação e são bastante dúcteis. Todavia, existem ainda algumas dificuldades, do ponto de vista da aplicação tecnológica, associadas ao processo de fabricação desses materiais.

Obtenção de vidros metálicos

A bibliografia registra que os primeiros vidros metálicos foram produzidos por Pol Duwez e Ronald H. Willens, em 1960, no California Institute of Technology USA. Utilizando uma técnica que consiste em prensar uma pequena quantidade do metal fundido entre duas superfícies metálicas resfriadas, ocorre então uma rápida troca de calor, suficiente para evitar que o metal se solidifique segundo uma estrutura cristalina, mantendo seus átomos a disposição randômica apresentada quando na fase líquida.

A partir desses resultados, novas técnicas para obtenção de vidros metálicos foram sendo desenvolvidas, não apenas do tipo “resfriamento contra superfície metálica”, mas também técnicas envolvendo deposição por evaporação de finas camadas sobre uma superfície resfriada, produção de amorfos através de descargas em plasmas, implantação de íons em matrizes cristalinas, etc.

Entre os métodos tipo “resfriamento contra uma superfície metálica , o mais utilizado, sem dúvida, é o chamado “melt-spinning”. Este método consiste num jato do material fundido dirigido contra a superfície de um disco metálico rotativo que é mantido à temperatura ambiente.

O metal fundido,quando em contato com a superfície fria do disco, resfria a uma taxa de -106 °C/s, dando origem a uma fita metálica com alguns milímetros de largura e umas poucas dezenas de microns de espessura (~30 m). (A pequena espessura é que possibilita uma taxa de resfriamento tão alta pois, devido à grande diferença entre a massa do disco e do material fundido e também porque os metais apresentam grande condutividade térmica, o metal resfria e solidifica extremamente rápido, num tempo menor do que o necessário para a ordenação cristalina dos átomos).

A análise de Raios-X do material, após o processo de fabricação, possibilita verificar se o sólido se encontra realmente no estado amorfo ou não. Se a estrutura apresentar característica de cristal, então o difratograma apresentará picos de intensidade característicos; caso a estrutura seja amorfa, esses picos estarão ausentes e a curva de intensidade será mais suave, semelhante à apresentada por líquidos .

Atualmente o número de vidros metálicos produzidos é muito grande, sendo considerável a diferenciação apresentada em suas propriedades físicas e mecânicas. A maior parte desses vidros metálicos são constituídos à base de ferro (majoritário) e elementos do tipo semi-metais em metalóides (minoritário).

Utilização dos vidros metálicos

Desde a produção dos primeiros vidros metálicos verificou-se que algumas de suas propriedades, notadamente as de origem magnética, se prestariam bastante bem para muitas aplicações tecnológicas. Devido a suas propriedades magnéticas intrínsecas, apresentando efeitos de maior magnitude quando comparados com materiais convencionais (ferritas e outras ligas de ferro, por exemplo), os vidros metálicos permitem um grande número de aplicações em eletrônica e aparelhos elétricos de potência, tais como transformadores.

Apesar de muitas das propriedades ligadas à estrutura dos vidros metálicos não serem completamente compreendidas, seu desenvolvimento para uso tecnológico tem acontecido de modo bastante rápido, particularmente no que se refere a aplicações envolvendo suas propriedades magnéticas. Outros campos de aplicação ainda não atingiram alto grau de desenvolvimento principalmente devido a competição entre o custo da fabricação desses materiais e o beneficio advindo de sua aplicação. No entanto, com o avanço na pesquisa de novos métodos utilizados na sua obtenção, esse fator complicador atual tende a ser ultrapassado em breve, levando a um alargamento do campo de aplicação tecnológica desses materiais.

Por: Tarciso Antônio Grandi

Depto de Física UFSC

Florianópolis SC

Fonte: Site Mundo Curioso