Sharp debate sobre uso de energia solar no Japão

Mesmo tendo 9 % de seu faturamento proveniente de painéis solares, Sharp se coloca contra propostas de legislação em prol da energia renovável

Presidente da Sharp, Mikio Katayama
Mikio Katayama, presidente da Sharp. No presente sistema, usar uma fonte alternativa seria ainda mais caro, para indústrias que consomem muita energia

 

Enquanto o Japão repensa sua dependência da energia nuclear devido ao acidente nuclear em Fukushima, a Sharp Corp. se vê na frente do debate sobre a próxima alternativa. Uma proposta para mudar a política energética do Japão aumentaria os custos da eletricidade para a Sharp e outras indústrias. A Sharp — cujos maiores negócios são telas de cristal líquido e aparelhos de televisão — integra o Keidanren, um lobby empresarial poderoso do Japão que é contra propostas de legislação em prol da energia renovável.

Mas a companhia pode se beneficiar das novas leis, que obrigariam as geradoras a comprar eletricidade de fontes renováveis. A empresa é a maior fornecedora de painéis solares, que responderam por cerca de 9% do faturamento total da Sharp no último ano fiscal, de 3,02 trilhões de ienes (US$ 38,78 bilhões).

O presidente da Sharp, Mikio Katayama, deu uma entrevista recentemente ao Wall Street Journal na sede da empresa, em Osaka. A seguir, trechos da conversa:

WSJ: Como o acidente nuclear em Fukushima Daiichi mudou a natureza do debate sobre energia renovável?

Mikio Katayama: Nos últimos anos, a maioria das pessoas tem falado da energia solar como uma das maneiras de combater o efeito estufa. Reduzir as emissões de carbono era o principal incentivo para promover as fontes renováveis. Se você se concentrar na questão do efeito estufa, pode argumentar que usar mais energia nuclear já é suficiente.

Desde o acidente nuclear, as discussões não se limitam mais ao contexto do efeito estufa. À medida que as pessoas se tornam mais cientes dos riscos da energia nuclear, o Japão se pergunta algo mais fundamental sobre como garantir a energia, como fez durante as crises do petróleo nos anos 70.

WSJ: É necessário que o Japão se afaste gradualmente da energia nuclear?

Katayama: Seria simplista demais dizer que a energia nuclear é boa ou ruim. Não há dúvida que as pessoas estão começando a questionar a segurança e confiabilidade da energia nuclear. Ninguém diz “por favor, construa uma usina nuclear ao lado da minha casa”. O verdadeiro custo da energia nuclear pode ser diferente do que se calculava. Mesmo assim, no presente sistema, usar uma fonte alternativa seria ainda mais caro.

A segurança pode ser a questão mais importante para as pessoas vivendo relativamente perto da energia nuclear, mas pode não ser para os que vivem relativamente distantes. As pessoas ricas podem não se preocupar em pagar um pouco mais pela eletricidade, enquanto outras podem achar doloroso. Entre empresas, indústrias que consomem uma grande quantidade de energia e o setor de serviços, que não exige muita energia, podem ter perspectivas diferentes. A questão é como encontrar uma maneira de criar um plano negociado e todo mundo aceitá-lo. É nisso que os líderes políticos precisam trabalhar.

WSJ: O custo da energia solar é competitivo?

Katayama: As pessoas muitas vezes interpretam de maneira errada o custo da energia solar. O custo maior é o investimento inicial de comprar os painéis solares e instalá-los.

Como a geração de energia solar não envolve turbinas, motores ou outros sistemas mecânicos, sua durabilidade é muito longa. Os semicondutores usados em nossas células solares podem durar mais de um século. Os painéis solares no Japão ainda são usados principalmente nos telhados das casas, e as casas japonesas geralmente só duram cerca de 30 anos. Quando as casas são demolidas, também são os painéis solares no telhado.

Mas nas grandes usinas de energia solar, quando você recupera o investimento inicial, o resto do custo é só manutenção. Grandes projetos de energia solar nos EUA e Europa são todos baseados nessa análise de custo de longo prazo. O Japão ainda não desenvolveu um sistema de geração de energia solar para uso industrial, porque o país tem dependido principalmente da energia térmica ou nuclear.

WSJ: Como a Sharp concorre com os fabricantes chineses de painéis solares?

Katayama: A energia solar, ou qualquer outra energia, está na esfera das políticas de governo. Seria um erro imenso pensar que o custo da energia solar é determinado pela concorrência entre empresas privadas. Os governos podem se envolver de várias maneiras, como a tarifa fixa ou outros subsídios para a construção de instalações. Como resultado de uma decisão estratégica, a China tem muitas fabricantes de painéis solares. Isso está causando um excesso de oferta. Dizem que os estoques atuais da China são maiores que a demanda mundial inteira deste ano. O que o Japão pode fazer? Se o governo não fizer algo sobre essa situação, não teremos escolha senão enxugar nossas operações domésticas.

WSJ: Por que a margem de lucro da Sharp no negócio de painéis solares é tão baixa?

Katayama: O Japão já falou sobre energia renovável no contexto do efeito estufa, mas o governo implementou poucas medidas concretas até agora para promovê-la. Construímos nossa [nova] fábrica no Japão na expectativa de que a demanda interna por energia solar iria crescer. Mas a diferença entre a demanda real e nossa capacidade está tornando nossas operações domésticas menos lucrativas. Também já tentamos exportar mais painéis solares do Japão, mas a alta do iene desde a crise financeira nos deixou menos competitivos no exterior.

Fonte: The Wall Street Journal