Com estrutura pré-montada em aço, residência high-tech utiliza vidro e tecnologia a favor do meio ambiente
Ser um nômade, mas levar consigo uma casa maravilhosa, que você desmonta, dobra e guarda em uma malinha, como faz o Gato Felix. Imaginação? Não. A casa R-128, em Stuttgart, na Alemanha, é quase isso, só que um pouco mais pesada. A inspiração, porém, não tem nada de nômade e foi encontrada nas torres tradicionais da cultura do norte do Iêmen, onde Werner e Ursula Sobek conheceram o Mafradsch, ou, para os árabes, o andar mais alto da torre, onde os assuntos mais importantes da vida são tratados.
Implantado no topo de uma montanha, com vista para Stuttgart e longe dos olhos de curiosos, o projeto incorporou a experiência fantástica de liberdade e contato direto com a natureza e as estrelas que o casal de arquitetos viveu no Iêmen. Para estar com a natureza, a transparência do vidro. Para estar de bem com o meio ambiente – e com a própria consciência -, uma construção toda erguida com materiais recicláveis, auto-suficiente na produção de energia térmica e ainda capaz de gerar eletricidade por elementos fotovoltaicos.
Continuidade, minimalismo, luxo e muito conforto resumem a ambientação de interiores, pensada para proporcionar o máximo de flexibilidade, característica garantida sobretudo pelas instalações elétricas e hidráulicas, cujos dutos são conduzidos por canais feitos de folhas de alumínio (recicláveis) que atravessam o interior da fachada. Não existindo camada inferior de reboco, ou qualquer outro revestimento sobre o fechamento de vidro, os canais ficam disponíveis e podem ser abertos para alterações em qualquer ponto, e a qualquer hora.
“O desejo inicial era esgotar todas as possibilidades existentes da construção e da arquitetura, entrando em campo desconhecido para o desenvolvimento de uma nova forma de interferência no ambiente”, diz o arquiteto Werner Sobek. Assim, buscou-se uma arquitetura de integração entre o desenvolvimento de formas, organização do espaço e aplicação de materiais segundo as necessidades atuais e futuras da humanidade.
Aspecto marcante do projeto da casa R-128, o conceito para produção e reaproveitamento de energia térmica determinou uma estrutura em vidro triplo com 10 cm de espessura, preenchida de gás inerte e barreira de convecção, além de revestida com folha de metal que reflete raios ultravioleta. Assim encapsulada, a casa está totalmente isolada em relação às temperaturas externas e mesmo que o gelo se cristalize sobre a superfície externa da parede de vidro, ou que o verão seja extraordinariamente quente, o interior permanece em temperatura agradável.
A circulação do ar também constitui importante função para a manutenção do conforto térmico e para o caráter sustentável da residência. O sistema regula não só a circulação geral do ar, como promove também a recuperaçao do calor proveniente da exaustão, não perdendo, assim, sua energia térmica. A temperatura interna é automaticamente regulada em cada andar da casa e, caso ultrapasse o nível desejado, os registros de transferência de calor instalados no teto serão preenchidos com água fria. Aquecida pela energia térmica, a água dos registros é bombeada para baixo, onde se encontra o convertor que armazenará seu calor em reservatório isolado, até que ocorra nova queda de temperatura.
O conforto é garantido pelo fato de a área sensível para o registro da temperatura interna corresponder a 40% da área útil. Nesse caso, torna-se quase impossível notar temperaturas de transição entre o mais frio e o mais quente. A recilagem é constante e o sistema fecha-se em autofornecimento de energia térmica, entre estações frias e quentes, o que confere sustentabilidade ao projeto e economia de gás residual, que seria liberado na atmosfera por calefação.
Toda a energia necessária para a circulação mecânica de ar, convertores e aquecimento ou resfriamento de água é produzida por 48 elementos fotovoltaicos instalados no centro da cobertura e que estão conectados a toda a área. Esse sistema produz, em circunstâncias ideais, 6,72 kW/h. A rede elétrica pública sustenta, contudo, um reservatório de energia que poderá ser reabastecido em caso de baixa produção de eletricidade pela casa.
Sustentabilidade na pele
Nas fachadas sul e norte, as placas de vidro medem 2,80 m de altura por 1,36 m de comprimento; nas leste e oeste, 2,80 m por 1,42 m. O que definiu as dimensões das placas foi o comprimento máximo possível das folhas de isolamento térmico. Desta forma, priorizou-se um conceito mais econômico, com menor número de peças e, por conseqüencia, maior rapidez de montagem e desmontagem, sem contar a beleza provida pela continuidade.
O trabalho de montagem de toda a estrutura metálica foi feito com precisão absoluta, em sistema de pré-montagem, e concluída em apenas quatro dias graças à facilidade prorporcionada pelo desenvolvimento de peças especiais, previamente parafusadas nas colunas e livre de porcas ou peças de fixação do encaixe. O prédio todo, excluída a fundação, pesa 39.800 kg.
As placas de vidro estão presas à estrutura por pads horizontais. O peso das placas está distribuído verticalmente pelas barras de tensão que se estendem até o teto. A sustentação da fachada fica, assim, invisível. Em cada andar existem ainda pelo menos duas janelas acionadas por voz ou touch screen. Um motor elétrico empurra um trilho-correia adaptado à porção inferior da janela para fora, produzindo a abertura. Ao fechar-se, a correia é novamente encaixada dentro da fachada.
As lajes da casa são constituídas por painéis pré-fabricados de madeira de 3,75 m x 2,80 m e 6 cm de espessura. Suspensas por vigas e não parafusadas, as lajes receberam revestimento plástico. Toda a comunicação vertical é feita por uma escada que atravessa os quatro andares, criando uma seqüência de aberturas nas lajes até o último pavimento.
Conforto Térmico
A temperatura interna é automaticamente regulada em cada andar da casa e, caso ultrapasse o nível desejado, os registros de transferência de calor instalados no teto serão preenchidos com água fria. Aquecida pela energia térmica, a água dos registros é bombeada para o convertor, fixado sob a placa de fundação, que armazenará seu calor em reservatório isolado, até que ocorra nova queda de temperatura.
O ar fresco pode ser aquecido ou resfriado. Para que a temperatura constante do solo seja utilizada como fonte de calor ou de resfriamento para o ar de entrada, ele é transferido primeiramente para o convertor, e, em seguida, sugado pelo bloco sanitário. No inverno, o calor da exaustão será utilizado para o aquecimento do ar frio de entrada, que chegará a 20 graus. Esse sistema complexo de reciclagem da energia térmica limita a perda de calor do ar em até 30% no inverno.
Geladeira Sensível
Muitas funções na casa são acionadas a partir de sensores de freqüência, controles de voz ou touch screens. Iluminação, abertura de janelas, irrigação do jardim e ajuste da temperatura, por exemplo, são gerenciados por um software especialmente desenvovido para esse projeto. Frank Heinlein, do escritório Werner Sobek Arquitetura, conta que, como muitos sistemas foram pioneiros, alguns inicialmente apresentaram pequenas falhas, por mais detalhado que tivesse sido o projeto.
Foi o caso do refrigerador original, que possuía um sensor de microondas sensível às freqüências de telefones celulares. Programada para abrir pela freqüência gerada pelo movimento das mãos, bastava passar pela geladeira carregando um celular para que a porta se escancarasse. A solução encontrada foi substituir os sensores de microondas por processadores ópticos, não sensíveis à transmissão de sinais de telefonia móvel.
Jogo de Encaixar
A estrutura do prédio acompanha a modulação da fachada de vidro e é formada por quatro esqueletos de aço parafusados compondo os andares, cada um com 2,80 m de altura, totalizando uma casa de 11,20 m de altura. Doze colunas estão ordenadas em um quadro de 3,85 m x 2,90 m e conectadas por vigas em duas direções. Nos pontos de nó da estrutura, os quatro cantos de cada coluna são cortados por pedaços densos de aço, de quinas pontiagudas e exatas, que se tornam arranques para as vigas. Trações cruzadas reforçam a estrutura verticalmente nas porções norte, sul e leste, onde estão sobrepostas. O teto também recebeu reforço dessas trações. As lajes são compostas por painéis de madeira de 3,75 m x 2,80 m e 6 cm de espessura.
FICHA TÉCNICA
Arquiteto: Werner Sobeck
Projeto geral: Werner Sobeck Ingenieure, Stuttgart
Projeto de energia: Transsolar Energietechnik, Stuttgart
Projeto hidráulico: Ing.-Büro Müller, Weissach
FORNECEDORES
Aço e fachada: Se-Stahltechnik, Stammham; vidro: Glas-Fischer, Murr; Guardian, Thalheim; Bischoff Glastechnik, Bretten; piso: Merk-Holzbau, Aichach; instalações elétricas: Elektro Tausk, Stuttgart; sensores: Jochen Köhnlein Gebäudeautomation, Albstadt; mobiliário: Fleiner, Stuttgart
Por Giovanny Gerolla
Fonte: revista aU